No dia 24 de dezembro de 2009 passei a noite num restaurante badalado em Berlim, jantando com o meu marido, Joaquim. Recém-casados, pensamos que seria uma libertação deixar nossas famílias e as romarias de ceias no Rio de Janeiro, uma gincana que temos de enfrentar todos os anos. Sem falar na função que é encontrar um presente especial para cada parente com um orçamento restrito. Que equívoco! Viajar no Natal foi uma das experiências mais deprimentes da minha vida.
O frio nas ruas congelava a alma. O restaurante não tinha decoração festiva. Muitas mesas estavam vazias e pessoas jantavam sozinhas ao nosso lado. Senti falta daquela agitação característica, da comida farta, da troca de presentes, dos parentes que, mesmo uns sendo mais chatos e outros mais legais, nos são caros.
Este ano nosso Natal começou antecipado, com um jantar que a minha sogra, Ana Lucia, fez apenas para os filhos, genro e noras no dia 23. E ela bota pra quebrar. Manda muito bem na cozinha (o que acaba sendo um problema pra mim, pois meu marido tem um nível de exigência com comida um tanto elevado). Só pra dar um gostinho: teve foie gras com pain d’épices, confit de canard e crème de marrom com chantilly de sobremesa.
Ontem, dia 24, começamos a noite com um brinde na casa do meu cunhado Sergio e da minha irmã Renata, reunindo meu irmão Marcello, tio-padrinho Ró, minha única avó, Sylvia, e meus pais, Katia e Mauricio, que são divorciados há muitos anos, mas civilizados o bastante para valorizar a beleza desse momento, junto com os filhos e o neto, antes de cada um seguir seu caminho. De lá acompanhamos a minha mãe à casa de uma tia muito querida, a tia Dalal, onde ceamos divinamente e nos divertimos com amigo oculto até altas horas. Por conta da minha gravidez e do cansaço do Felipe, tive que abrir mão da terceira parada da noite, na casa de outra tia querida, a Maria Helena Sobral.
Hoje era o meu dia de anfitriã. O tradicional almoço que a minha sogra oferece para a família Jordão aconteceu na nossa casa. Minha única incumbência era assar o peru que ela me entregou ontem já temperado. Mas, quando o telefone tocou às 8h30 da manhã com ela ligando para me lembrar da tarefa, fiquei uma arara. Tinha ido dormir às duas e meia da manhã e estava exausta. Enquanto bocejava, besuntava a ave de manteiga e envolvia o tabuleiro com papel laminado, não pensei nada de bom. Mas depois, quando voltei pra cama para dormir mais um pouquinho, agradeci por ter uma sogra tão dedicada, que se preocupa em reunir a família e proporcionar uma comida tão especial. Me senti pequena. O que eu estava fazendo não era nada comparado com todo o esforço dela e a montanha de comida que ela estava produzindo havia vários dias. Só pra fazer creme de castanha, soube que foram quatro horas descascando três quilos do fruto cozido. O chutney de cranberry que ela prepara é outra iguaria. O presunto com abacaxi, a farofa com frutos secos, o folhado de bacalhau, estava tudo divino. Queria poder comer mais dessa comida ao longo do ano…
O grand finale da tarde foi quando o meu sogro se vestiu de Papai Noel e tocou a campainha carregando um saco de presentes. A presença das crianças traz à festa um toque mágico. Lembrei ao bom velhinho de elogiar o Felipe por ter entregue sua chupeta este ano e pedi para acrescentar um dedo de prosa sobre deixar que a mãe corte suas unhas. Tomara que funcione, pois não aguento mais ter de entrar de madrugada com lanterna no quarto dele pra conseguir realizar a poda.
Moral da história é que é um privilégio ter uma família grande dos dois lados e poder viver intensamente o espírito de Natal. Quando chegar o dia em que nós teremos de fato que assumir o bastão… Pretendo honrar sempre essa linda tradição!