Prazer na gravidez

O apetite sexual durante a gravidez é um tema delicado de abordar, até porque não existe um padrão. Tenho amigas que revelam ter se transformado em verdadeiras ninfomaníacas, outras que não foram tocadas por seus companheiros depois que a barriga cresceu, outras ainda que perderam, por si só, o interesse no assunto e, por último, as felizardas (ou contadoras de vantagem) que mantiveram um ritmo padrão, tudo dentro da normalidade.

Tem homem que passa a sentir tesão apenas no escuro, outros que preferem de ladinho, sem precisar encarar a visão da barriga. Muitas relatam que passaram a ser prioritariamente as responsáveis por tomar a iniciativa, já que o par fica cheio de dedos e com medo de machucar o bebê.

Esse tipo de conversa até que acontece entre amigas mais íntimas, mas nenhuma delas jamais trouxe à tona o tema masturbação durante a gestação. Disso não se fala… Até porque orgasmo na gravidez ainda é visto como tabu e até mesmo tido como perigoso. Imagine então o que pensar das mães que buscam o prazer solitário…

Confesso que por aqui está tudo bem, mas meu interesse vem caindo com o avanço das semanas. Diria que ele anda inversamente proporcional ao crescimento da barriga. A falta de timing tem sido o maior problema. Tenho ondas de entusiasmo em momentos que não são viáveis e indisposição nas horas mais perfeitas. 

Para diminuir o preconceito e tentar entender melhor o comportamento e as questões fisiológicas envolvidas, pedi à sexóloga e dra. Françoise Quintanilha Padula que escrevesse algumas linhas sobre o assunto.

 

Delícias do sexo solitário na gestação

Quando Antonia me pediu para explorar o tema do título, fui em busca de fontes científicas para embasar minha narrativa, porém, sem esperança. Procurar artigos científicos com as palavras-chave “masturbação” e “gravidez” soava estranho. Encontrei. Algumas noções apresentadas me pareceram antiquadas, já que a sexualidade carrega consigo tabus e preconceitos.

O primeiro preconceito, e o mais comum, reside no tema em si. A masturbação, principalmente a feminina, é assunto de difícil exposição para inúmeras mulheres, e por diferentes questões: familiares, religiosas, morais e pessoais. 

A sexualidade na gravidez também traz vários estigmas e medos. Casais temem estar fazendo mal ao bebê quando têm relação, principalmente porque uma das primeiras recomendações diante de risco de aborto ou de parto prematuro é a interrupção das relações sexuais vaginais, acreditando que pode haver estímulos para contração uterina.

 

Quanto ao desejo sexual feminino na gestação, não existem justificativas para suas diferentes formas. Pelo fato de ser regido de forma multifatorial, não há regras ou lógica na sua manifestação. Esta será individual e poderá flutuar durante essa fase da vida da mulher.

  

Colocando tudo isso sob um mesmo prisma, será simples identificar que aquela mulher com o desejo aumentado será aquela que terá mais relações sexuais e se masturbará mais, sendo o oposto verdade para aquela com desejo sexual hipoativo nesse período. Certo? Infelizmente, não. Ainda tempos algumas variáveis significativas, como os medos, as dúvidas não compartilhadas com os obstetras e, a mais importante, o marido. Sanemos então as dúvidas, já que, quanto a este, cada um tem o seu, e quanto a isso há pouco a fazer.

A relação sexual é saudável e recomendável para o casal durante toda a gravidez, sendo motivo de controvérsia a contra-indicação da mesma nas pacientes com risco de aborto ou de parto prematuro. O bebê pode ser beneficiado pela liberação de hormônios como a serotonina, que causam na mãe e nele uma sensação de conforto e relaxamento. O sexo provoca na mulher uma melhora da autoestima, diminui a labilidade emocional, além de passar uma sensação de confiança, paixão e amor, o que melhora o relacionamento conjugal. 

Associados a todos esses fatores psíquicos, estudos demonstram que a penetração vaginal incrementa a ação da musculatura perineal, sua percepção durante o parto vaginal e seu poder contrátil. 

Entretanto, mesmo diante de tantas evidências, podemos nos deparar com casais que, por motivos variados, não desejam manter relações sexuais durante a gravidez. E sempre devemos respeitar o desejo individual. Por isso a masturbação pode assumir um papel maior na sexualidade feminina no período. Ela pode ser realizada da forma que trouxer prazer, a gestante ou ao casal, uma vez que a masturbação mútua também é muito bem vinda. Pode-se usar vibradores, massageadores clitorianos, ou qualquer outro objeto que sua criatividade alcançar. Sendo apenas necessários cuidados redobrados de higienização dos mesmos. Durante uma masturbação com vibrador vaginal, algumas mulheres temem que o vigor ou a profundidade da penetração seja nociva para o bebê, mas ela pode ser realizada com segurança, imitando a intensidade do seu próprio parceiro. Pois a masturbação mostrou-se absolutamente segura nos casos de abortamento e de parto prematuro, já que o orgasmo parece diminuir estes riscos de forma considerável, uma vez que não causam contrações uterinas significativas. 

Minha recomendação como especialista: tenham prazer, pois qualquer forma de prazer deve ser considerada positiva.

Françoise Quintanilha Padula é casada e mãe de dois filhos: Rodolfo e Valentina. Ginecologista e Obstetra da Febrasgo, especializada em Sexualidade Humana pela USP, especialista em Reprodução Humana e especialista em Endometriose e Cirurgia Minimamente Invasiva pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês. Hoje atua em seu consultório em Petrópolis, além de ser monitora em laparoscopia no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo.