Ontem falei do medo que desenvolvi depois de ter filho. Hoje vou falar do medo de perder esse filho, sentimento que nasceu junto com a descoberta da primeira gravidez.
Impressionada com três amigas muito próximas que tinham sofrido aborto espontâneo no último ano, já tinha adotado como estratégia que, no dia em que engravidasse, não contaria a novidade para quase ninguém fora da família até se passarem as 12 primeiras semanas, período que, estatisticamente, concentra 80% das perdas. A propósito, esta é uma atitude muito diferente da que estou tendo agora, compartilhando o dia a dia da gravidez desde o marco zero. Como as pessoas mudam… Isso não quer dizer que eu não tenha mais medo, só mudei a forma de encarar o imponderável.
Dito e feito lá atrás. Consegui controlar minha língua, a do Joaquim e a da família, que manteve sigilo. Cada semana completa era comemorada como se fosse um aniversário. Mas eu vivia com medo. Qualquer cólica, dor de cabeça, cansaço excessivo, já colocava uma pulga atrás da minha orelha. Pensava no pior como forma de me proteger e não ser pega desprevenida.
Certo dia, no banheiro da redação da revista Go Where Rio, onde trabalhava como editora, ao me limpar vi um pouco de sangue no papel higiênico. Muito pouco, mas o suficiente para me deixar abalada. Falei com a minha obstetra, Juraci Ghiaroni, que me pediu para ficar observando todos os sintomas e prescreveu Ultragestan por duas semanas, um comprimido de progesterona que parece ser de engolir, mas que, na verdade, serve para você aplicar com o dedo o mais fundo na vagina que conseguir. Não tive mais nada depois desse leve sangramento, porém, por si só, ele já foi um baita susto. Naquele momento, quando eu ainda devia estar com uns dois meses de gestação, percebi o quanto já estava ligada no bebê.
Na ultrassonografia de três meses, a tal translucência nucal, que seria o divisor de águas para contar da gravidez para o mundo, o resultado da medida da nuca marcou um ponto acima do limite, um número que nunca esqueci: 2,6 qualquer coisa. Saí de lá arrasada e procurei saber quem eram os melhores médicos de exames do Rio de Janeiro. Cheguei ao nome do dr. Sergio Simões, que, três semanas depois, fez em mim um exame de amniocentese. Uma decisão dificílima, pois põe em risco a vida do bebê. Vocês se lembram do meu post sobre o Nipt? Por isso considero uma revolução esse novo exame, que faz o diagnóstico precoce e de modo não invasivo sobre várias doenças genéticas! Só consegui ter o resultado da amniocentese com quatro meses de gravidez.
No caso do primeiro filho, a gente até consegue esconder a notícia, porque a barriga demora mesmo para aparecer. Minhas amigas mais próximas só souberam da gravidez do Felipe nessa época. Já, agora, me sinto uma grávida de seis meses com a barriga que tenho hoje. Acho que a musculatura cede mais rápido, sei lá o que acontece. Tenho até vontade de mentir e dizer que estou semanas mais à frente para evitar olhares críticos.
Depois do resultado relaxei muito mais e consegui curtir o fim da gravidez com menos preocupação. Até que, enfim, chegou o belo dia 5 de novembro de 2011, quando nasceu o meu príncipe, de parto normal, 39 semanas, 52cm e 3,360kg. Voltei para o quarto me sentindo vitoriosa, poderosa, realizada. A alegria durou aproximadamente duas horas. Recebemos o primeiro telefonema do pediatra Fernando Majzels, que já estava em casa, informando que o bebê tinha tido uma complicação no berçário, um episódio de apneia + cianose (ficou alguns segundos sem respirar e com a cor da pele roxa). Por precaução, seria levado para observação por algumas horas e não subiria mais para o quarto, onde estava sendo esperado.
Vinte minutos depois o pediatra telefonou novamente para informar que havia acontecido um segundo episódio, que ele estava retornando ao hospital e que o procedimento indicado seria internar o Felipe na UTI e fazer um checkup completo. Depois ele explicou pessoalmente que esse quadro não era compatível com um nascimento a termo, com os resultados Apgar obtidos e nem com o tamanho e peso do bebê, absolutamente normais. Poderia ser um problema neurológico, cardíaco etc. Meu mundo caiu.
Aquelas primeiras 24 horas seriam decisivas para saber se o Felipe tinha, de fato, algum problema. Ele fez todos os exames possíveis e não teve mais nenhuma crise. À medida que os resultados iam chegando, eliminando uma ou outra hipótese, meu coração voltava a bater. Porém, tive uma reação muito estranha, que foi puro instinto de autopreservação.
Enrolei metade do dia para ir até a UTI vê-lo. Ele nasceu às 6h26 da manhã e eu só devo ter subido às 7 da noite. O Joaquim foi antes, mas eu preferi esperar. Os bem-nascidos que havia encomendado para receber os amigos assim que saísse da sala de parto foram entregues logo cedo no hospital, mas a lista que seria disparada com o comunicado do nascimento foi abortada. Poucas visitas, muitos doces. Resultado: metade da minha família teve dor de barriga. Naquela ansiedade, todos comeram umas 10 unidades cada.
No kit maternidade que havia preparado (vou falar dessa tralha em detalhes num post futuro), havia um baralho. Pedi pra jogar cartas para me distrair. Minha sogra, minha mãe e meu cunhado foram meus parceiros de jogo. Seguraram a onda e conseguiram me distrair. Passei o dia forte, conversando meio apreensiva, mas sem choradeira.
Sabe por que não fui no berçário antes? Não queria me apaixonar ainda mais por um bebê que eu não sabia se ia viver…
Como esta é uma longa história, vou deixar pra contar o resto amanhã. Fui.