Avalanche

Já que ontem falei de cocô, vou aproveitar o embalo para falar de golfadas.

Tomei sustos horríveis com o Felipe desde uns 15 dias de vida até ele completar mais ou menos um ano de idade. Meu filho parecia personagem do filme O exorcista, colocando pra fora o leite ingerido minutos antes. Não se tratava de uma golfadinha não, era um vômito projetado que ia longe. No início, a cena se repetia a cada dois ou três dias, depois, em intervalos maiores.

Por ter uma abundante produção de leite, pensava que ele estava mamando mais do que deveria. Passei a controlar o tempo no relógio para que não passasse de 10 a 15 minutos por seio (já não lembro o tempo exato). Adotei também novas posições em que ele ficasse o mais vertical possível durante a sucção, e ainda dava uma pausa antes de oferecer o segundo peito, na esperança de que ele arrotasse. Essas atitudes ajudavam a evitar novos episódios, mas não eram garantia de nada.

Abro aqui um parágrafo para explicar que existem duas maneiras de amamentar. Gostaria muito de ouvir opiniões de quem fez igual ou diferente de mim. Cada pediatra segue uma linha. Tem os que recomendam dar um único peito a cada mamada e os que indicam alternar os seios na mesma mamada, porém controlando bem qual mama começou e qual encerrou para fazer o inverso na lactação seguinte.

O meu pediatra, dr. Fernando Majzels, sugeriu a segunda opção (com alguma razão clara, já não lembro qual). Nem questionei, pois me parecia natural esvaziar os dois pneus de uma vez só. Me sentia mais equilibrada. No entanto, tinha uma coisa que me afligia. Na mamada seguinte os dois peitos estavam equivalentemente reabastecidos, mas havia um problema: enquanto o Felipe mamava no primeiro, o segundo começava a pingar pelo estímulo recebido no vizinho. Eu precisava usar um desses absorventes de peito ou ser ágil o suficiente para catar uma tolha fralda e não deixar sujar a roupa. Lamentava também pelo leite desperdiçado.

Tentei, mas não me adaptei com a concha coletora. Primeiro, porque não há blusa que disfarce aquela protuberância. Poderia ter limitado o uso para esse momento, só que achava meio nojento armazenar um leite que ficara escorrendo pela pele e aquecendo dentro da concha. Se cada gota me fosse preciosa, talvez tivesse deixado essa frescura de lado. Um hábito de higiene que considerava importante: sempre que possível dava uma lavada no peito com água e sabão na pia imediatamente antes de amamentar. Meu filho nasceu no início do verão e eu transpirava mais do que o normal.

Voltando aos momentos de regurgitação, meu maior temor era de que o Felipe pudesse ter esse refluxo deitado no berço e sufocar. Também ficava preocupada em deixá-lo com fome, mesmo o pediatra me garantindo que boa parte da mamada ele absorvia e que aquele leite colocado pra fora na frequência que eu relatava não comprometeria o ganho de peso.

Passei a ficar muito tensa na primeira meia hora pós-mamada. Inclinei levemente o colchão, colocando na base uma espuma em formato de triângulo. Passei a usar rabo de cavalo e reduzi almofadas e objetos decorativos no entorno das áreas de risco. Só dei mole ao não ter mandado fazer uma segunda capa para a poltrona de amamentação. Quando um episódio desses acontecia, eu tinha que jogar um pano por cima até a capa voltar lavada.

Minha intenção não foi assustar ninguém, e sim mostrar que isso pode acontecer com você e que a médio prazo fica tudo bem. Só não posso negar que o cheiro desse leite que o bebê bota pra fora é azedo e desagradável. Já o paladar, tive a sorte de nunca ter precisado descrever, ao contrário de um amigo, que levantou a filha no alto e recebeu na goela um jato de golfada de um jeito que não lhe restava alternativa, senão engolir…

 

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